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Seguindo as recomendações da OMS e Ministério da Saúde, passei pelo isolamento social obrigatório durante 15 dias após voltar do exterior. Mais precisamente, de uma viagem que seria minhas férias para o Peru. Infelizmente não foram as férias que eu queria, tampouco as que planejei por tanto tempo.
Quando saímos do Brasil em 14/03 rumo à Lima no Peru, já havia sido decretada a pandemia do coronavírus, mas os mercados de forma geral na América Latina ainda não tinham tomado medidas efetivas de fechamento. Existiam poucos casos e nenhuma morte. Nem mesmo na Europa, onde a situação já estava ruim, as fronteiras tinham sido fechadas. Logo, assumi o risco e resolvi manter a viagem, acreditando que não haveriam desdobramentos maiores, afinal iria manter distância das pessoas e evitar espaços aglomerados.
Logo quando cheguei a Lima no fim de tarde do dia 14, a cidade estava linda, com muita gente na rua, bares e restaurantes cheios, muita gente de máscaras, e lá estávamos nós, evitando aglomeração, mas turistando. No dia seguinte, fomos ao centro e vimos a cidade relativamente cheia, com muitos turistas. Entre alguns drinks e alguns lanchinhos, percebemos um "ar" diferente entre as pessoas, grudadas nas telas dos seus celulares ou ligadas nos televisores de estabelecimentos.
Chegando ao hotel, ligamos a TV e recebemos a notícia de que o presidente do Peru havia decretado que as fronteiras seriam fechadas em 24 horas, e que todas as atividades do país estavam suspensas. O desespero bateu. A LATAM Airlines Brasil não atendia o telefone e nem respondia ao chat. A Embaixada Brasileira já estava fechada. Não havia muito o que fazer, então decidimos ir bem cedo para o Aeroporto de Lima tentar antecipar a volta ao Brasil. Aí começou a loucura.
O aeroporto
Chegamos cedo ao aeroporto e as filas já estavam gigantescas. Sem muitas informações disponíveis, o aeroporto estava uma loucura. Uma infinidade de turistas estava na mesma situação que eu: desesperados, sem nunca ter passado por uma situação dessas.
Depois de umas sete horas em pé, numa fila que andava tão rápido como uma tartaruga, fomos surpreendidos pelo exército. Os fardados entraram no aeroporto e no alto-falante soltou-se o anúncio de que o aeroporto estava sendo fechado naquele momento e que todos, sem exceção, deveriam sair, pois ele seria fechado. Nem preciso dizer que imediatamente o caos se instaurou. Era gritaria para todo lado, e ao tentar perguntar para o pessoal do aeroporto sobre o que fazer, eles simplesmente disseram "procurem abrigo, se mantenham seguros, pois não podemos fazer nada".
Houve um corre-corre louco por parte de todo mundo - parecia cena de filme. Conseguimos chamar um táxi e no calor do momento pedimos para ir para a Embaixada do Brasil em Lima. Era o único lugar que vinha em mente.
A busca por uma solução
Quando chegamos, dezenas de outros brasileiros se aproximavam ao mesmo tempo pedindo ajuda. As portas da embaixada já tinham sido fechadas e a orientação novamente era procurar abrigo. Ninguém sabia o que fazer. Em tese o decreto determinava o fechamento de fronteiras e isolamento social somente à meia-noite daquele dia e ainda eram três da tarde, mas tudo já estava fechando. Contatos foram trocados com outros turistas brasileiros que foram à embaixada e grupos de WhatsApp foram criados.
Corremos para voltar ao hotel e conseguimos reativar a reserva que havíamos feito check-out antes mesmo de amanhecer. No momento, era um alento.
Liguei para a LATAM, para a embaixada, para o Concierge do cartão de crédito, para um amigo que é assessor de deputados e nada. Todo mundo tentava de tudo, mas ninguém conseguia fazer algo naquele momento. Todo mundo foi pego de surpresa com o fechamento das fronteiras. Embora soubéssemos que o caos estava se aproximando, não acreditávamos que ele de fato chegaria. E ele chegou.
Nas ruas, o exército e a polícia fiscalizava o toque de recolher. Vale ressaltar que foi um toque de recolher de verdade, nada parecido com o que o Brasil está vivendo, com várias pessoas batendo perna nas ruas. Naquele momento, ficamos sabendo pela mídia que eram quase quatro mil brasileiros presos só no Peru na mesma situação que eu, sem saber o que fazer.
Os grupos começaram a pipocar no WhatsApp e gradativamente tentamos organizar ações orquestradas na tentativa de conseguir sair daquela situação.
Bombardeamos as redes sociais da embaixada com mensagens e nada de respostas. Conseguimos contato com a mídia, e vários repórteres de várias emissoras, jornais, revistas, sites e blogs entrevistaram colegas para cobrir tudo o que estava acontecendo, e de alguma forma pressionar as autoridades a tomar as providências necessárias. Depois de diversas matérias jornalísticas, a embaixada resolveu se manifestar, informando que estava ciente e tomando providências, mas nada de concreto ou claro o suficiente para nos tranquilizar.
Os dias iam passando e nada de uma resposta da LATAM ou do governo federal no Brasil. Enquanto isso, nem podíamos sair para comprar alimento, e viver apenas do café da manhã do hotel não ajudaria muito a manter a imunidade alta em uma pandemia.
Fonte: Falando de Viagem