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por Cínthia Leone, do Instituto ClimaInfo, com informações da Assessoria de Imprensa da Universidade UNG
O isolamento social para controlar o avanço do novo coronavírus reduziu a quantidade de veículos circulando nas grandes cidades e, consequentemente a poluição do ar. Com a reabertura das atividades, o retorno dos carros à rua pode elevar sensivelmente a concentração de poluentes, o que favorece o agravamento de doenças respiratórias, incluindo a COVID-19.
Pesquisadores da Universidade de Harvard estabeleceram a primeira ligação entre ar poluído e o novo coronavírus. Segundo o estudo (1), pacientes de áreas muito poluídas antes da pandemia que contraíram a COVID-19 têm mais probabilidade de morrer do que as pessoas infectadas que moram onde o ar é mais limpo.
O cenário cenário é mais preocupante no Sudeste, no Centro Oeste e na maior parte das Regiões Nordeste e Norte do país, onde os próximos meses são de poucas chuvas, o que dificulta a dispersão da poluição.
Em cidades como São Paulo, a restrição à circulação de automóveis gerou uma redução notável de poluentes, mas que foi diferenciado nas diversas regiões da cidade (2) e (3).
Mas a diminuição da frota de ônibus fez com que o transporte coletivo se tornasse um vetor de transmissão do novo coronavírus. O que os especialistas temem é que, por medo de contaminação, mais pessoas optem por se deslocar de carro, levando a qualidade do ar a níveis piores do que o observado antes da pandemia.
Uma pesquisa do Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA) (link) revela que os automóveis são responsáveis por 71% das emissões do poluente na cidade de São Paulo, contra 25% dos ônibus e 4% das motocicletas, levando-se em conta o material particulado lançado por pessoa transportada.
"O material particulado lançado ao ar em virtude da queima de combustível dos veículos automotores é um poluente crítico e imperceptível ao olho nu”, explica o doutor em Geociências Fabrício Bau Dalmas, professor de Análise Geoambiental da Universidade UNG. “Ele afeta o pulmão e pode causar asmas, bronquite, alergias, além de outras graves doenças cardiorrespiratórias, podendo ocasionar óbitos."
Um estudo publicado pela Revista Brasileira de Epidemiologia (4) em 2011 já apontava um aumento de 3% a 4% da taxa de mortalidade diária por doenças cardiovasculares associadas à maior concentração de material particulado no ar. Para doenças respiratórias, a mortalidade diária é 6% superior, e pode chegar a um aumento 14,2% no caso de idosos, sendo que as pessoas mais afetadas são as que possuem piores condições socioeconômicas.
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"A redução na concentração destes poluentes poderia ser iniciada com uma drástica alteração no modal de transporte das grandes cidades, que deveriam focar mais em transportes coletivos e elétricos", sugere Dalmas.
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O ar que queremos
Foi exatamente para não agravar os problemas respiratórios que algumas cidades usaram o período de quarentena para repensar a mobilidade urbana, inclusive para além do transporte motorizado. A prefeita de Paris, Anne Hidalgo, tinha como meta que cada rua da cidade tivesse uma faixa para ciclistas até 2024. Com a chegada da pandemia, o medo do contágio no transporte público fez a prefeitura liberar 22 milhões de euros para a criação de ciclovias temporárias, gerando uma malha de 650 quilômetros de ciclovias na capital da França.
Bruxelas, capital da Bélgica, usou a quarentena para transformar 40 quilômetros de faixas para carros e estacionamentos em novas ciclovias. Milão, na Itália, e Barcelona, na Espanha, que foram epicentros da pandemia, também aproveitaram o esvaziamento das ruas para aumentar as zonas calmas (regiões da cidade em que carros não podem circular), alargar as calçadas para incentivar o deslocamento a pé, e ampliar e reprojetar a malha de ciclovias.
Em Bogotá, capital na Colômbia, 76 quilômetros de ciclovia começaram a ser instalados desde março. A prefeita Claudia López Hernández destacou que a medida ajudará na redução de doenças respiratórias sazonais no município, aliviando o sistema de saúde local em meio à crise do novo coronavírus.
Iniciativas como essas têm sido pensadas para as cidades brasileiras, mas pela própria população e não pelas prefeituras. A Associação dos Ciclistas Urbanos de São Paulo (Ciclocidade), por exemplo, está realizando uma campanha para que a capital paulista apresente um plano emergencial de abertura de ruas para a mobilidade ativa durante a pandemia do coronavírus. A principal aposta do projeto é a criação de cliclovias temporárias.
“Com exemplos em diversas cidades ao redor do mundo, temos visto a bicicleta e o caminhar sendo pautados por políticos e lideranças como soluções para conter a contaminação da doença e tornar a mobilidade da cidade mais eficiente”, justifica o texto da campanha. A iniciativa pode ser acessada em http://www.ruasativaspandemia.bonde.org/#block-26999.
(3) https://www.climatempo.com.br/noticia/2020/04/07/quarentena-reduz-poluicao-em-sao-paulo-2756