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As condições de tempo e Clima influenciam diretamente o setor de energia, desde os processos de planejamento de geração, operação e manutenção de hidrelétricas, complexos eólicos e solares, distribuição e transmissão de energia até a comercialização de energia. Porém, em um mundo onde vento, água e sol geram receita, como a meteorologia pode ajudar na prática?
Para entender esta relação, primeiramente é necessário entender a diferença entre tempo e clima. No qual tempo é o conjunto de condições atmosféricas e fenômenos meteorológicos, como temperatura, chuva, vento, umidade, nebulosidade em curto prazo (horas a meses). Já o clima é o comportamento médio e estatístico destas variáveis meteorológicas em uma determinada localidade, num longo período. De acordo com a Organização Mundial de Meteorologia (OMM), o período clássico para a determinação do clima é de 30 anos.
Desta forma, a previsão do tempo busca representar as condições meteorológicas de um determinado local em um futuro próximo, desde as próximas horas (nowcasting) até as próximas semanas. Enquanto a previsão climática visa apresentar a tendência destas variáveis meteorológicas em uma região para os próximos meses, indicando se as variáveis meteorológicas estarão acima, abaixo ou próximas à média histórica (climatologia).
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AGORA VAMOS COMEÇAR A ENTENDER NA PRÁTICA
O próximo passo é o estudo de caracterização climática, que possui extrema importância para a geração de energia renovável. Auxiliando na análise do potencial de geração de uma determinada região e no planejamento de geração para os próximos anos, de acordo com o impacto dos sistemas atmosféricos, climáticos e oceânicos.
Para a realização da caracterização do clima de uma região, pode-se utilizar os dados observados de estações meteorológicas, ou seja, os dados medidos no local de interesse. Mas também é possível utilizar dados de reanálises para a reconstrução de séries históricas, utilizando informações obtidas através de satélites meteorológicos e modelos numéricos robustos. Diversos centros de pesquisa se dedicaram ao desenvolvimento dessas bases de dados (National Centers for Environmental Prediction (NCEP), European Centre for Medium-Range Weather Forecasts (ECMWF), Japan Meteorological Agency (JMA), que, constantemente, são revisadas e melhoradas, permitindo o desenvolvimento da meteorologia mundial.
As duas metodologias apresentam ótimos resultados, mas alguns cuidados devem ser tomados. As reanálises permitem representar longos períodos, tornando possível avaliar a variabilidade do clima ao longo das últimas décadas. Porém, além de ser necessário utilizar uma reanálise de qualidade, a comparação da série reconstruída com os dados medidos em campo aumenta a confiança e removem viés e outros erros sistemáticos.
Para o uso das medições em campo, primeiramente é necessário avaliar se o instrumento e os sensores estão instalados corretamente e se o período da série histórica é suficiente para representar o clima da região. Pois um desafio enfrentado comumente na geração eólica é basear todo o planejamento de geração futuro em uma pequena série de medições (menor do que 5 anos). Desta forma, toda a variabilidade do clima é negligenciada, ou seja, as medições podem ser referentes a um período de vento mais ou menos intensos do que a normal climatológica, fazendo com que o planejamento também esteja enviesado.
O PULO DO GATO: ÍNDICES E OSCILAÇÕES CLIMÁTICAS
De uma forma geral, a maior parte do planejamento de geração é feita por engenheiros, baseando-se em análises estatísticas de dados passados, porém, o comportamento do oceano e sua interação com a atmosfera é um importante fator que muitas das vezes é deixado de lado. Devido às dimensões continentais do Brasil, existem diversos sistemas meteorológicos, climáticos e oceânicos que impactam o clima de uma determinada região e consequentemente seu potencial de geração (CAVALCANTI 2016).
No Nordeste do Brasil, principal região de potencial eólico instalado, a Temperatura da Superfície do Mar (TSM) do Oceano Atlântico é extremamente importante para a definição da posição e intensidade da Zona de Convergência Intertropical (ZCIT), um dos mais importantes sistemas meteorológicos atuando nos trópicos (FERREIRA, 1996). Acompanhe a previsão do impacto de fenômenos meteorológicos no setor de energia em nosso linkedin oficial de energia, com publicações diárias.
No Oceano Atlântico observam-se diversas oscilações e sistemas climáticos, com diferentes resoluções espaciais e temporais. A Oscilação Multidecadal do Atlântico (OMA, KNIGHT et al., 2006) é causada por variações na TSM e no cisalhamento vertical dos ventos horizontais em grandes áreas do Atlântico Tropical, com periodicidade de 20-40 anos. A fase positiva (negativa) da OMA acontece quando o Atlântico Tropical Norte está anomalamente quente (frio), fazendo com que a precipitação sobre o Nordeste brasileiro reduza (aumente) (KAYANO et al., 2016).
Figura 1: Índice da Oscilação Multidecadal do Atlântico. Fonte: NOAA PSL
Outro modo de variabilidade climática importante para o Hemisfério Sul é a Oscilação Antártica (ou Modo Anular Sul, GONG e WANG, 1999) (Figura 2), capaz de afetar as condições de tempo principalmente nas regiões centro-sul do Brasil, devido a formação e intensificação de sistemas de bloqueio, que por sua vez afetam todo o padrão de convergência de umidade e passagem de sistemas frontais, fatores fundamentais para a formação da Zona de Convergência do Atlântico Sul (ZCAS), sistema meteorológico responsável pelo padrão úmido no Centro-Oeste e Sudeste brasileiro (CAVALCANTI 2016).
Figura 2:Oscilação Antártica ou Modo Anular Sul. Fonte: NCEP/NOAA.
As oscilações no Oceano Pacífico também impactam as condições de tempo e clima em praticamente todo o Brasil. O mais conhecido é o El Niño - Oscilação Sul (ENOS) que é um fenômeno meteorológico de escala global, caracterizado pela interação entre o oceano e a atmosfera.
Para cada região do Brasil, época do ano e fase da oscilação (El Niño ou La Niña) os efeitos são diferentes. Portanto, é extremamente importante analisar a série histórica de dados meteorológicos, detalhando quais oscilações climáticas compõem o clima de uma determinada região e principalmente, considerar os sistemas meteorológicos, climáticos e oceânicos na elaboração do planejamento de geração eólica, hídrica ou solar.
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Referências Bibliográficas
CAVALCANTI, I. F. A. Tempo e clima no Brasil. Oficina de textos, 2016.
FERREIRA, N. S. Zona de Convergência Intertropical. Climanálise Especial. Edição Comemorativa de 10 anos. FUNCEME. v. 1, p. 136 – 139, 1996.
GONG, D.; WANG, S.. Definition of Antarctic oscillation index. Geophysical research letters, v. 26, n. 4, p. 459-462, 1999.
KAYANO, Mary T. et al. A further analysis of the tropical Atlantic SST modes and their relations to north‐eastern Brazil rainfall during different phases of Atlantic Multidecadal Oscillation. International Journal of Climatology, v. 36, n. 12, p. 4006-4018, 2016.
KNIGHT, J. R.; FOLLAND, C. K.; SCAIFE, A. A. Climate impacts of the Atlantic multidecadal oscillation. Geophysical Research Letters, v. 33, n. 17, 2006.