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Foto: istock
por Cinthia Leone/ jornalista do Climainfo
O Brasil é um dos países mais privilegiados em quantidade de água disponível, mas está passando pela pior seca dos últimos 91 anos. A gestão inadequada dos recursos hídricos, com altas taxas de desperdícios e vazamentos, somada a uma percepção errada do risco de estiagens severas em um mundo cada vez mais quente, trouxe o país a uma situação trágica de escassez em boa parte do Sudeste, Centro-Oeste e partes do Sul e do Norte.
A primeira consequência da estiagem foi o aumento nos preços da comida. A seca também diminuiu a capacidade de geração hidrelétrica, levando ao aumento do uso de termelétricas - que encarecem a conta de luz, contribuem para o aquecimento global e também consomem muita água em processos de resfriamento, agravando ainda mais a crise hídrica localmente.
Mesmo com o aumento no uso dessas usinas poluentes e caras, faltará energia a partir de outubro, segundo o Operador Nacional do Sistema, que recomendou aumento ainda maior no uso de termelétricas e importação de energia.
Impactos do aquecimento global no setor elétrico
Com o calor se aproximando, a atenção está se voltando para o impacto nas torneiras. Diversas regiões do país já enfrentam problemas de abastecimento, o que pode se agravar com a aproximação do verão. Sob a influência do fenômeno La Niña, que reduz a chuva no centro-sul durante a primavera, a tendência é que a situação do país piore nos próximos meses.
Não é de hoje que o Brasil está secando
Segundo um estudo divulgado em agosto pelo Mapbiomas, o país perdeu cerca de 15% de sua água desde a década de 1990. Esse volume corresponde, por exemplo, ao dobro de toda a água doce disponível no Nordeste. De acordo com o recente relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), a estimativa mais otimista para o Brasil já prevê o agravamento das estiagens ao longo deste século.
Região Sudeste
Desde o dia 2/9, a cidade de Franca, no interior de São Paulo, faz rodízio de abastecimento. Planos de racionamento já estão em curso em outras cidades paulistas, como Salto, que desde 7 de julho só oferece 12 horas de água por dia aos moradores. Aproximadamente 80% da cidade é abastecida pelo Ribeirão Piraí, e em agosto, a água do rio não chegou nem ao número 0 da régua de medição.
Em Bauru, 90 mil pessoas abastecidas pelo rio Batalha ficam sem água em dias alternados, enquanto São José do Rio Preto faz rodízio de 13 a 20 horas. Em Itu, quem desperdiça água pode ser multado, e as autoridades locais admitem que a situação pode ficar ainda mais complicada se não chover o previsto para o mês de outubro.
Na cidade de São Paulo, moradores de Cidade Tiradentes, na zona leste, já reclamam da falta e da qualidade da água que sai das torneiras. No conjunto das represas, o volume de água para a Região Metropolitana de São Paulo é 20% menor do que o registrado em 2013, ano anterior à última crise hídrica.
Reservatórios da Grande São Paulo estão em alerta
No Rio De Janeiro, os principais reservatórios do estado estão chegando ao limite: o de Paraibuna está em 27% da capacidade; Santa Branca 19%; Jaguari 29%; e o do Funil 38%.
Com a aproximação do verão, o volume de água disponível pode ser insuficiente para atender ao aumento no consumo.
Em Mariana (MG), o nível das captações está baixo e o consumo aumentando devido ao calor e à baixa umidade relativa do ar. Não chove há mais de 70 dias, e o abastecimento de água já está comprometido no município e cidades do entorno.
A seca no Sul de Minas já afeta profundamente o turismo, sobretudo na região de Furnas. No triângulo mineiro, é a produção de alimentos que segue severamente impactada. Lagos e pequenos córregos da região usados na irrigação secaram, e a economia dos municípios enfrenta forte declínio.
Amazônia seca
No Acre, o rio que dá nome ao estado se aproxima da menor cota histórica, registrada em 2016, quando o nível ficou em 1,30 metro. No dia 1/9, o Departamento Estadual de Água e Saneamento iniciou a instalação de bombas para aumentar a capacidade de captação, o que pode mitigar os problemas de abastecimento que já afetam os bairros mais altos da capital do estado.
Rotina de falta d’água
O estado do Paraná já convive com problemas de abastecimento desde março do ano passado. A capital Curitiba e mais 13 cidades da região metropolitana estão há meses sob um sistema de rodízio em dias alternados.
A situação é semelhante à do Distrito Federal, que enfrenta a pior crise hídrica dos últimos vinte anos. A Adasa (Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento Básico do Distrito Federal) decretou estado de alerta no final de agosto e declarou que se não chover nas próximas semanas, a água para o abastecimento da região irá acabar em cerca de 70 dias.
Em Mato Grosso do Sul, a seca histórica do rio Paraguai levou o serviço de abastecimento do estado, Sanesul, a adotar um tipo alternativo de captação de água - bombas serão colocados no meio do leito do rio, numa tentativa já desesperada de manter o abastecimento dos municípios de Corumbá, Ladário e Porto Murtinho.
Prejuízos
Já o rio Paraná está tão seco que a navegação na hidrovia Tietê-Paraná está suspensa desde abril. Segundo o Sindicato dos Despachantes Aduaneiros, os prejuízos devem chegar a R$ 3 bilhões, afetando principalmente a produção agrícola.