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Para que serve o COP26?
Cerca de 200 países se reunirão durante duas semanas em Glasgow, na Escócia, para elaborar planos para enfrentar a crise climática. Globalmente, as perspectivas são sombrias, com as emissões de gases de efeito estufa aumentando e os impactos ligados à mudança climática atingindo todos os cantos do planeta. Os governos precisam explicar como irão controlar coletivamente esta crise.
Por que precisamos dessas grandes reuniões internacionais?
A mudança climática é a crise existencial do nosso tempo. Está no topo ou perto do topo das preocupações públicas na Europa, nos EUA. A América Latina, a África e a Ásia estão sendo atingidas por secas, tempestades, enchentes e outras condições extremas. É absolutamente correto que todos os governos do mundo se reúnam para elaborar um plano. A verdadeira vergonha não é o tamanho da reunião, mas a falta de ação rápida por parte dos grandes poluidores.
Existe alguma esperança?
O Acordo de Paris de 2015 funcionou. Seis anos depois, o conceito de emissões líquidas de gases de efeito estufa zero até meados do século se consolidou: esta é agora uma realidade para a qual centenas de países e milhares de empresas estão trabalhando. O relatório do Efeito de Paris 2020 da Systemiq sublinhou as mudanças nos setores de transporte, indústria pesada e serviços que estamos vendo. Mas a ciência é clara: precisamos avançar mais rapidamente para limpar a economia global - a COP26 pode ajudar a impulsionar esta transição viável, desejável e acessível.
Quais são as expectativas para a reunião em Glasgow?
Os resultados esperados da COP26 podem ser divididos em três categorias: primeiro - precisaremos de progresso nos cortes globais de emissões de GEE e um compromisso de fazer isso mais rápido; segundo - precisaremos ver um pacote de ajuda para as nações mais vulneráveis ao Clima instável e que já estão sendo atingidas pelos impactos climáticos; terceiro - provavelmente veremos acordos setoriais, que vão desde proibições de carvão e petróleo, datas para encerrar a venda de carros movidos a combustíveis fósseis e desmonetização do desmatamento.
Mais detalhes sobre estas 3 categorias, por favor...
(i) Os governos foram solicitados a entregar seus planos climáticos nacionais antes da COP26, de modo que teremos uma ideia decente de como serão as trajetórias de emissões para o resto da década de 2020. Não será suficiente, então a COP26 precisa de uma decisão de todos os governos (sobretudo aqueles que submeterem planos climáticos fracos, caso do Brasil) para fazer mais, mais rápido e mais cedo.
(ii) Os países em desenvolvimento estão sendo atingidos pela crise climática e precisam de apoio. Isso significa que as nações ricas estão entregando um plano em Glasgow para atingir o apoio anual de US$ 100 bilhões prometido, e elaborando um plano para incrementar esse apoio depois de 2025. Isto significa reconhecer que a adaptação é central para a luta contra a crise do clima, e que é necessário trabalhar em como lidar com as perdas e danos que as nações mais pobres já estão sofrendo.
(iii) Fora das negociações formais, alguns clubes de países estão se formando para assinar acordos que proíbam novos projetos de carvão, petróleo e gás; o controle do desmatamento e a redução radical das emissões de metano, e a eliminação gradual da venda de carros a gasolina e diesel na década de 2030. A situação atual dos compromissos de eliminação gradual dos veículos a gasolina e a diesel é mapeada aqui.
Onde estamos agora?
A última avaliação da ONU sobre os planos climáticos sugere que as emissões aumentarão 16% até 2030. Isso está bem fora da meta - os cientistas dizem que as emissões precisam cair 45% até 2030 para limitar o aquecimento em apenas 1,5C.
O que significa 1,5C?
A ciência é realmente clara sobre limitar o aquecimento em 1,5°C. Um planeta aquecido significa aumentos na frequência e intensidade de extremos de calor e de frio, ondas de calor marinhas, precipitações e ciclones mais intensos, aumento de secas e de degradação de solos e reduções no gelo marinho ártico, cobertura de neve e do permafrost.
É realmente assim tão ruim?
As estimativas dos custos potenciais do aquecimento contínuo ainda variam muito, mas são muito mais altas do que estudos anteriores haviam sugerido. Por exemplo, dois estudos de destaque, um da Swiss Re e outro da University College London, projetaram perdas que vão de 10% e 23% do PIB global neste século, se as emissões não forem reduzidas rapidamente. Este nível de dano econômico seria maior do que o observado tanto na pandemia de Covid quanto na Grande Depressão dos anos 30.
A meta de 1,5°C basicamente já era?
Isso não é correto. O último relatório da ciência climática da ONU foi claro: ainda podemos nos evitar de um aquecimento maior, mas precisamos agir agora - e isso significa que todos os países e todos os setores da economia global devem fazer sua parte. Isso exigirá um esforço maciço, mas toda redução de emissões conta.
Onde a coisa já está apertando?
Este ano vimos Madagascar avisar que está à beira de uma fome generalizada induzida por problemas com o clima, após 4 anos de chuvas fracas. Tivemos inundações devastadoras na China e na Alemanha, uma onda de frio inédita que congelou o estado do Texas, nos EUA, incêndios fatais na Grécia e na Turquia, uma cúpula de calor sufocante nos EUA e no Canadá, uma seca extrema no Afeganistão e tempestades intensas que castigaram o Caribe. Cada vez mais nenhum lugar está a salvo.
Quem precisa melhorar metas de cortes de emissões?
Os países do G20 são responsáveis por quase 80% das emissões globais (O Brasil é o sexto maior emissor), e todos esses grandes poluidores precisam se antecipar à próxima cúpula do G20 em Roma, no final de outubro. As nações do G20 que ainda não entregaram planos climáticos ambiciosos antes da COP 26 incluem, além do Brasil, Índia, China, Austrália, Arábia Saudita e Rússia.
Quem precisa doar dinheiro?
Os EUA, UE, Reino Unido, Japão, Canadá e Austrália estavam entre os principais países desenvolvidos e blocos que se comprometeram a fornecer US$ 100 bilhões de financiamento climático aos países mais vulneráveis por ano até 2020. Que eles não conseguiram fazer isso já está claro, a partir de dados da OCDE. Há uma lacuna de 20 bilhões de dólares ao ano, e esses países estão sob pressão para preenchê-la.
Metano
Como o último relatório do IPCC destacou, o efeito de aquecimento do metano é 30 vezes maior que o dióxido de carbono (CO2), o que significa que cortes rápidos no metano poderiam ajudar significativamente os esforços para manter o aquecimento a 1,5°C. Em setembro de 2021, os EUA e a UE apresentaram um novo compromisso sobre o metano, prometendo reduzir as emissões do gás em 30% de 2020 a 2030. Os signatários iniciais, juntamente com a UE e os EUA, são: Argentina, Gana, Indonésia, Iraque, Itália, México e Reino Unido. Este acordo é uma grande notícia, mas o movimento internacional de redução de metano terá implicações para setores importantes da economia brasileira, como a pecuária.
Desmatamento
Florestas em pé são uma das alavancas críticas que podemos puxar para manter a meta de 1,5°C ao alcance - mais importante, se continuarmos a derrubar nossas florestas, o carbono armazenado em nossas árvores vai todinho para a atmosfera. Na COP 26 é esperado um conjunto de acordos envolvendo investidores, bancos de desenvolvimento, reguladores financeiros e legislação de comércio internacional para forçar o fim do desmatamento. Esta coleção de anúncios envia uma mensagem clara a qualquer empresa de agricultura, madeira e mineração: o desmatamento não é mais aceitável ou ocultável.
Planos Net Zero
Dá para acreditar nas atuais metas líquidas zero - os chamados planos Net Zero das empresas?
Múltiplas análises de compromissos líquidos zero das empresas descobriram que, embora estejam mirando (aparentemente) na direção certa no longo prazo, ações concretas de curto e médio prazos para realizar estas mudanças parecem não caminhar ao lado da promessa. Além disso, muitas das reduções de emissões prometidas são na verdade compensações de emissões para lá suspeitas, e vários outros truques e brechas são usados para evitar um verdadeiro passo em direção a emissões quase nulas nas próximas décadas. O desafio agora é criar um sistema de responsabilidade e pressão que obrigue empresas a incorporar a neutralidade climática em suas operações em vez de deixar esse assunto para o setor de marketing.
Sem trapaças
O Artigo 6 do acordo de Paris é um elemento remanescente do Manual de Regras de Paris que não teve sua negociação concluída - por isso é possível que se fale muito dele durante a próxima COP. O atraso na sua negociação se deve às partes - Brasil incluído - que procuram transferir créditos de sistemas anteriores (do Protocolo de Quioto) para o sistema que seria criado com o Artigo 6 de Paris. Analistas afirmam que essas exigências podem fazer com que cortes de emissões do passado sejam contados duplamente, minando a integridade de mercados de carbono.
O que será suficiente para chamar a COP26 de sucesso?
A COP 26 não é uma final da Copa do Mundo. Não haverá uma pontuação clara e não teremos ganho a batalha quando ela terminar. Os pontos de referência são claros: precisamos reduzir as emissões em cerca de 45% até 2030, mas estamos no caminho certo para um aumento das emissões até esta data. A COP deve e pode apresentar um plano para acelerar radicalmente os cortes de emissões nos próximos 3 anos, um plano forte e justo para apoiar os países em desenvolvimento na linha de frente desta crise, fechar brechas para fraudes climáticas, começar a fechar a indústria de combustíveis fósseis em nível global e impedir a derrubada de mais florestas.