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É uma questão de interesse fundamental para todos, diz Gregory Dick, professor de microbiologia da Universidade de Michigan, piscando o olho: "De onde viemos e quais são as condições que sustentam uma vida como a nossa?" Essa pergunta remeteu a ele e a colega Judith Klatt, do Instituto Max Planck de Biologia Marinha, ao que chamam de "Terra primitiva".
A Terra se formou há cerca de 4,54 bilhões de anos, com uma margem de erro de mais ou menos 50 milhões de anos. Vestígios em rochas e fósseis indicam que os primeiros sinais de vida no planeta datariam de cerca de 3,5 bilhões de anos (tudo isso são apenas estimativas baseadas nas evidências coletadas até hoje).
Quanto à vida como a conhecemos, a vida biológica, ela pode ter começado um pouco depois. Talvez mais 1 bilhão de anos mais tarde, em grandes profundidades nos oceanos, onde prosperam microrganismos chamados "extremófilos".
Os cientistas acreditam que a origem da vida pode ser sido facilitada quando a rotação da Terra diminuiu, há cerca de 2,4 bilhões de anos. Uma rotação mais lenta gera dias mais longos, os quais significam mais luz e consequentemente mais tempo para os organismos produzirem oxigênio, postulam Dick e Klatt num estudo recém-publicado na revista Nature Geoscience.
"Terra primitiva" no fundo de um lago
A Terra leva cerca de 365 dias para completar uma translação em torno do Sol. Na verdade, são 365,25 dias, e esse tempo extra é responsável por algumas discrepâncias no calendário romano, ajustados com anos bissextos.
Em linhas gerais, um dia dura 24 horas (também uma média, para simplificar as coisas), o tempo do planeta dar uma volta em torno do próprio eixo. Porém cientistas acreditam que esse movimento já foi mais rápido, e que já houve dias de seis horas, bilhões de anos atrás.
Ainda não se sabe como e quando Terra passou a ter oxigênio. Para investigar isso, Klatt, Dick e outros colegas desenvolveram uma estratégia original, ao estudar "tapetes de cianobactérias" no lago Huron, nos Estados Unidos.
A uma profundidade de cerca de 23 metros, os cientistas pesquisam numa área que representaria a "Terra primitiva": a água ali tem pouco oxigênio e é rica em enxofre, falta toda a vida vegetal e animal típica do lago. Mas há um denso tapete roxo de cianobactérias.
Dois tipos de bactérias se alternam
Elas contam entre as bactérias mais antigas conhecidas na Terra. Aquáticas e fotossintéticas, elas precisam de luz solar para sobreviver.
"Queremos entender como o oxigênio foi produzido na Terra primitiva e a única fonte biológica significativa de oxigênio no planeta são as cianobactérias, que se desenvolveram bilhões de anos atrás", explica Klatt.
Em seu artigo na revista científica, os cientistas propõem que
"a fotossíntese oxigênica em tapetes microbianos foi uma fonte substancial de oxigênio para o Grande Evento de Oxigenação (GOE) há cerca de 2,4 bilhões de anos".
Segundo os cientistas, no lago Huron, as cianobactérias, de cor arroxeada e produtoras de oxigênio, têm que "competir" com as bactérias oxidantes de enxofre, que são brancas.
"Do anoitecer ao amanhecer, as bactérias que comem enxofre ficam sobre as cianobactérias, bloqueando seu acesso à luz solar. Quando o sol sai pela manhã, as comedoras de enxofre se movem para baixo e as cianobactérias sobem para a superfície do tapete." Assim, quando o Sol sai, as cianobactérias começam o processo de fotossíntese e produzem oxigênio.
"No entanto, demora algumas horas até que aconteça algo, há um longo atraso pela manhã", prossegue Klatt. "Ao que parece, as cianobactérias acordam bastante tarde. Como resultado, seu tempo para a fotossíntese é limitado a apenas algumas horas por dia."
Pesquisas em curso
Mas quando os dias na Terra ficaram mais longos − com mais tempo de exposição solar − elas produziram mais oxigênio. Segundo Brian Arbic, o oceanógrafo físico da equipe, quando o sistema Terra-Lua se formou, os dias eram muito mais curtos, possivelmente de seis horas.
Mas então "a rotação de nosso planeta diminuiu devido à força da gravidade da Lua e a fricção das marés", e os dias se tornaram mais longos.
Klatt acredita que a duração do dia e o oxigênio dos tapetes microbianos estão relacionados num nível "muito básico e fundamental": em dias curtos, há menos tempo para o oxigênio escapar dos tapetes.
A equipe inclui pesquisadores do Centro Leibniz de Pesquisa Marinha Tropical, na Alemanha, e do Instituto de Recursos Hídricos Annis, da Universidade Estadual de Grand Valley, EUA.
Eles ainda estão investigando amostras coletadas no fundo do lago e continuam monitorando as condições locais, para entender o que controla a produção de oxigênio em cianobactérias e explicar por que, ao que parece, o oxigênio só se desenvolveu realmente na Terra em tempos mais recentes. Deutsche Welle